segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Hermès X 284



Desde o momento em que a 284 tentou transformar a bolsa clássica Birkin, símbolo de exclusividade e objeto de desejo, em “it bag” tupiniquim (aliás odeio o termo “it”), reproduzindo a bolsa em moletom (as famigeradas “inspireds”), já era de se esperar o que aconteceu na última semana. Para quem ainda não viu, a Justiça de São Paulo concedeu uma liminar à Hermès que impede a 284 de produzir, exportar, manter em depósito e comercializar a “Birkin de moletom”, sob pena de pagamento de multa diária no valor de R$10.000.

A historinha, tentando usar o mínimo de “juridiquês” possível (inclusive porque eu ainda não sou advogada para sair falando), é a seguinte: a Hermès notificou a 284 extrajudicialmente para que parasse de comercializar o modelo “inspired” e a 284, tentando sair na frente, ajuizou uma ação declaratória contra a grife francesa, provavelmente querendo comprovar judicialmente que seu produto não é uma cópia da Birkin original.

Acontece que a Hermès apresentou reconvenção, que é uma das formas de resposta do réu no direito processual civil. Nela, o réu formula um pedido contra o autor, ligado àquele formulado originalmente. E daí surgiu a liminar, que é uma decisão “temporária”, na qual o juiz analisa superficialmente o mérito e que tem validade até ser proferida sentença. Não vou me aprofundar mais no assunto, porque não é exatamente o tema do blog, mas já vinha pensando em fazer um post sobre propriedade intelectual na moda e então falarei mais sobre isso em breve.

Agora convenhamos: péssima ideia a de tentar comprovar judicialmente que a “Birkin de moletom”, que inclusive é divulgada exatamente assim, usando o nome da outra, não é cópia. O modelo é reproduzido integralmente, apenas em tecido de qualidade inferior (beeeeeeeem inferior) e a 284 usou uma marca consagrada para promover seu produto, inclusive banalizando um item extremamente exclusivo. A decisão do juiz foi a esperada.

Quanto à minha opinião sobre os modelos “inspired”, acredito não dá nem pra argumentar que não sejam cópias. Não vejo qual a diferença de uma bolsa inspired para uma da 25 de Março, uma vez que elas fazem exatamente a mesma coisa: reproduzem um produto conhecido utilizando um material mais vagabundo. A única diferença são os preços das “inspired”, que não são muito condizentes com a qualidade de um produto de moletom. Para uma discussão mais aprofundada sobre o assunto, vejam o post sobre as bolsas de moletom no De Chanel na Laje.

Porém, nem tudo são lágrimas para as aspirantes a “it girls” que queriam a “it bag” de moletom. As fashion victims mais antenadas conseguiram pegar uma “queima de estoque” básica na Daslu: de R$399,00, as bolsas foram vendidas por R$120,00, antes de serem recolhidas.

Para as interessadas, abaixo a decisão completa:

"Vistos.

Alega a autora reconvinda em sua petição inicial que “em março de 2010, iniciou a produção e comercialização da linha “I’m not the original!”, que conta, dentre outros produtos, com a “Bolsa 284”, inspirada na denominada “Bolsa Birkin”, lançada pela ré reconvinte no ano de 1984.

Como expressamente admitido na petição inicial e constatado mediante a simples visualização das fotografias acostadas aos autos, a bolsa produzida pela autora reconvinda é idêntica à bolsa produzida pela ré reconvinte, diferindo apenas em relação ao material de confecção.

Pretende a ré reconvinte a antecipação dos efeitos da tutela. Seu pedido há de ser deferido, evidenciada nos autos hipótese de concorrência desleal.

A bolsa modelo Birkin elaborada pela ré reconvinte é ícone do alto luxo, situação mantida não somente por seu prestígio, mas também pelo elevado preço e pela dificuldade de aquisição imediata.

É um bem de consumo para poucas privilegiadas, que reflete um design criativo de sucesso e anos de investimento na divulgação da bolsa e em seu posicionamento estratégico de mercado.

A autora reconvinda, sem nenhum esforço de originalidade, aufere rendimentos à custa do desempenho alheio, ao produzir bolsa idêntica à prestigiada Birkin. E o fato haver a ressalva, em destaque, de que não se trata do modelo original, pela utilização da marca “I’m not the original”, não tem o condão de revestir de legitimidade sua conduta, pois mais do que os outros modelos de bolsa mencionados pela autora em sua petição inicial, a bolsa por ela produzida remete o consumidor imediatamente à imagem do produto original.

Destacar que um produto não é original não se configura salvo conduto para exploração comercial do prestígio de outrem. Até mesmo porque há menção direta ao produto da ré reconvinte no site da autora reconvinda http://www.284brasil.com.br/blog/?s=birkin+, onde se lê ser o “must have da 284” uma “Birkin de moleton”.

E não apenas o enriquecimento sem causa deve ser vedado pelo direito. Há na hipótese possibilidade de efetiva lesão à ré reconvinte. A existência no mercado de réplica de sua prestigiada bolsa, comercializada pela autora reconvinda, diferenciada apenas pelo material de confecção empregado, por certo poderá trazer danos à ré reconvinte, causando confusão entre os produtos postos no comércio e prejudicando a reputação desta.

Ao copiar um design criativo distintivo e fazer referências à bolsa “Birkin” original, beneficia-se a autora reconvinda do design e dos investimentos feito pela ré reconvinte na divulgação da bolsa, e prejudica-se a reputação da ré reconvinte de fornecer um produto exclusivo, voltado para um segmento de mercado altamente especializado.

A diluição da imagem do produto da ré reconvinte por certo lhe causa danos, pois quem o adquire o faz não somente pela beleza, mas também pela exclusividade.

Presentes, assim, os requisitos do “fumus boni iures e o periculum in mora”, defiro a antecipação dos efeitos da tutela para o fim de determinar à autora reconvinda que se abstenha de produzir, importar, exportar, manter em depósito e comercializar a “bolsa 284”, descrita na petição inicial, sob pena de pagamento de multa diária no valor de R$10.000,00 (dez mil reais), limitada a R$1.000.000,00 (um milhão de reais).

Intime-se a autora reconvinda, na pessoa de seu advogado, para que se manifeste sobre a reconvenção, no prazo legal. Int. Fls.100vº: Certidão do Cartório que deixou de expedir mandado de intimação visto a ausência do recolhimento das diligências do Oficial de Justiça – providenciar em cinco dias."


Beijo,
Cacau ♥

Um comentário:

  1. Sensacional o seu post!!!! Até que enfim alguém com quem compartilhar a minha opinião de que essa idéia de produtos "inspired" não significam nada além de cópias inferiores, de gente esperta querendo lucrar a partir da fama alheia.
    Por que não criar um produto novo, bacana, original? Por que copiar uma marca consagrada no mercado?
    O fato da Hermes cobrar uma fortuna pela citada bolsa é um abusrdo também, mas isso é assunto pra outro post.
    Parabéns Cah!
    Dulci

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